quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

2º espectáculo

A Ilha dos Escravos
(...)
A preparação da segunda peça não abrandou, apesar de todas as contrariedades resultantes do serviço militar e da guerra colonial levarem alguns de nós, impondo as necessárias substituições. Em 20 de Dezembro de 1970, no Teatro Ester de Carvalho, estreia “A Ilha dos Escravos” de Marivaux.

Assim, duas peças distintas com encenações baseadas em pressupostos diferentes passaram a ser mostradas em conjunto. Este aparente paradoxo resultou de mais uma grande discussão interna sobre produção teatral. Em causa estava o tempo de duração do espectáculo a apresentar, que segundo as normas locais na época nunca deveria ter menos de duas horas. Hoje seriam apresentadas isoladamente sem qualquer contestação ou hesitação, cedemos aqui para se avançar noutros aspectos. Com “A Ilha dos Escravos” de Marivaux, numa tradução livre de Luís de Lima, através do tom de comédia burlesca, pretendia-se denunciar a desigualdade que os homens permitem que reine entre eles.

Nesta encenação a peça, com cenário de João Flórido, era apresentada com um prólogo e um epílogo que remetia para um espectáculo de marionetas representadas por actores, era o teatro dentro do teatro. “Mas porquê assim? Porque não só a peça? Assim, para melhor se mostrar que se não nos libertarmos das velhas regras, continuaremos todos a ser marionetas manobradas pelos donos das mesmas.” (4)

A apresentação das duas peças não se pôde prolongar por muito tempo, porque mais alguém foi mobilizado e partiu para a guerra colonial, mas mesmo assim ainda foram representadas na Casa do Povo da Abrunheira. Foi a primeira saída do CITEC.

A instabilidade vivida então por todos os jovens limitava a constituição dum elenco mais ou menos fixo, que desse garantias de futuro. Mas se os resultados da aposta na formação de actores eram incertos havia pelo menos a consolação de se continuar a sua formação como espectadores. Assim, mantinha-se válida a aposta na formação e na busca da estrutura capaz de assegurar um trabalho regular e uma equipa estável.

Nesta perspectiva de formação era fomentada a ida dos elementos do grupo a espectáculos de teatro, com o pagamento das viagens e de cinquenta por cento dos bilhetes. Posteriormente a análise e discussão dos espectáculos vistos era realizada colectivamente, como forma de estimular o espírito crítico em todos os elementos do CITEC e de os tornar espectadores mais conscientes e activos.

A perfeita noção das limitações teóricas e técnicas existentes determinou muitas leituras, com muita discussão das mesmas e dos caminhos a trilhar. O que sempre foi consensual era o que não se queria fazer, o fazer diferente do que existia. À falta de melhor formação restava o ir ver muitos espectáculos e depois discuti-los, ler tudo o que se encontrava e reflectir sobre essas leituras. E continuar com a produção de peças que fossem estimulantes para todos e permitissem o crescimento do grupo.

(...)

(4) Do programa dos espectáculos “A Gota de Mel” e “A Ilha dos Escravos” feito pelo CITEC.

* excertos do texto CONTRIBUTO PARA A HISTÓRIA DO CITEC (1970-1974), publicado na Revista MONTE MAYOR editada pela CMMV.

Pintura de João Flórido, que reproduz o cenário.

Programa do espectáculo

Ficha técnica do espectáculo:

Elenco: António Caiado, António Tiago, Henrique Maranha, Henrique Milheiro, Hermínio Maranha, João Leal, Joaquim Argel, Joaquim Virgilio, Judite Maria, Licínio Cadima, Maria Elisa, Maria Isabel, Maria S. José, Sara Mendes e Pedro Tiago

Cenário e Adereços: João Flórido

Montagem, Som e Luz: Antonio Oliveira, António Veneza, Carlos Lucas, João Flórido, Joaquim Argel, José Alberto e Licínio Cadima.

Caracterização: Carlos Alberto Cunha e Carlos Oliveira Cunha

Execução musical: Eurico Simões e João Simões.

Figurinos: Gilberta Soares, Letícia Couceiro, Lurdes Morais, Valentina Couceiro e Vitoria Valente.

Encenação: Deolindo L. Pessoa

Estreia em 20 de Dezembro de 1970

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

1º espectáculo

A Gota de Mel

(…)

Porém, o arranque foi fortemente condicionado pela escolha de um texto dramático, pois as nossas escolhas correspondiam a textos não aprovados pela censura. No dizer de um amigo e colega de escola, que trabalhou na CMMV até ir para Angola e lá morrer na guerra, “vocês só sabem escolher peças proibidas pela censura”, após uma lista de onze textos enviada para exame prévio ter sido toda recusada.

Começava a ser urgente a apresentação pública do grupo, para as boas vontades não esmorecerem e se angariarem os meios para satisfazer as dividas já contraídas. O primeiro espectáculo do CITEC foi apresentado em 25 de Julho de 1970, no Teatro Ester de Carvalho, data posteriormente escolhida para se comemorar o aniversário do grupo, por corresponder à sua apresentação pública oficial. O espectáculo constou de duas partes: na primeira a representação de “A Gota de Mel” de Leon Chancerel, na segunda Vieira da Silva (1) interpretou baladas de sua autoria.

(…)

Neste espectáculo o texto de Leon Chancerel era cruzado com a leitura de notícias retiradas de jornais e revistas publicadas em 1970, que abordavam diferentes tipos de guerra e diferentes perspectivas sobre a mesma. Noticias essas que por serem bem verdadeiras atestavam de forma significativa que no dia a dia sucedem factos que poderão representar na vida real o papel que a gota de mel desempenha no coral de Leon Chancerel. Era precisamente para se chamar a atenção para eles que a peça começava com a leitura da primeira série de notícias, qualquer um dos factos descritos poderia ser a nossa gota de mel.

Para nós este espectáculo era um grito de esperança em melhores dias, ao morrerem os dois soldados não podia acabar tudo. O grito de esperança consistia precisamente na fé que tínhamos em que o homem despertasse finalmente do letargo em que caíra e mais ou menos cedo lançasse o seu grito de revolta por um futuro melhor em que a fraternidade não fosse uma palavra vã e destituída do verdadeiro sentido. Ou não fosse a nossa geração uma das sacrificadas pela guerra colonial que então existia em diferentes frentes.

“Morreremos então, sem saber porquê?

Sem saber porquê, morreremos então?”

O desenho de luz criava os diferentes ambientes da narrativa em diferentes tons, por vezes incidia mesmo sobre o público a fim de ele não ficar indiferente. A cena estava praticamente vazia, apenas com um escadote, uma escada de três degraus (recuperada do material existente no Teatro) e um bidão. Para além de uma aposta clara na palavra havia também uma aposta na linguagem corporal. Tudo isto recheado de muitas dúvidas e incertezas de como fazer, a frase “isto não está bem, mas não sei como fazer melhor” era frequente nas discussões durante os ensaios. Mais uma vez não havia certeza do que fazer, só se sabia bem o que não se queria fazer.

No final a reacção do público foi bastante favorável, o que a todos deu ânimo para se continuar, e a lotação esgotada garantiu os meios necessários para se avançar.

(…)


* excertos do texto CONTRIBUTO PARA A HISTÓRIA DO CITEC (1970-1974), publicado na Revista MONTE MAYOR editada pela CMMV.

Ficha técnica do espectáculo:

Elenco: António Veneza, Henrique Milheiro, Joaquim Virgílio, José Alberto e Licínio Cadima.

Cenário e Adereços: João Flórido e Deolindo L. Pessoa

Montagem, Som e Luz: João Flórido, João Leal e Joaquim Argel

Colaboração de Carlos Oliveira Cunha

Direcção de Deolindo L. Pessoa

Estreia em 25 de Julho de 1970

Fundação do CITEC

(…)

Quando o CITEC arrancou partiu do zero a todos os níveis, havia apenas uma enorme vontade de trabalhar e tinha um nome que queria homenagear: uma grande actriz nascida em Montemor-o-Velho. Se Ester de Carvalho foi para o teatro contra a vontade dos seus pais e os preconceitos da época, também o CITEC nasceu para o teatro contra todas as dificuldades, desde as económicas, à falta de instalações e às da própria legalização.

Na altura criar um grupo de teatro não era mesmo nada fácil, pois para além da necessidade de se mobilizar pessoas havia que ultrapassar uma teia de quesitos burocráticos e legais. Dadas as dificuldades encontradas na legalização do CITEC, como alternativa foi negociado um acordo com a Direcção do Montepio Recreio e Instrução, associação proprietária do Teatro Ester de Carvalho que passava por uma crise de sócios e precisava de rejuvenescer. Em função deste acordo todos os elementos do grupo inscreveram-se como sócios daquela colectividade e o CITEC passou a ser uma secção autónoma do Montepio Recreio e Instrução, situação que se manteve até ao “25 de Abril de 1974”. Depois o CITEC adquiriu personalidade jurídica própria, mas os seus elementos continuaram como sócios do Montepio.

Assim, para além do problema legal, o CITEC resolveu o seu problema de instalações para ensaios e espectáculos. Com este acordo podia utilizar o Teatro Ester de Carvalho sempre que a sala estivesse disponível, como contrapartida tinha que dar toda a receita duma representação por cada espectáculo montado pelo grupo e 50% da receita de todos os espectáculos apresentados por outros grupos. Em todo este processo houve o apoio imprescindível desde o início dum grande amigo, conhecido por Augusto Salazar (Augusto Gilberto Nunes Tiago).

(…)

* excerto do texto CONTRIBUTO PARA A HISTÓRIA DO CITEC (1970-1974), publicado na Revista Monte Mayor editada pela CMMV.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Comemorações dos 40 anos

O CITEC - Centro de Iniciação Teatral Esther de Carvalho foi fundado em 1970, em Montemor-o-Velho, tendo apresentado o seu primeiro espectáculo em 25 de Julho de 1970, no Teatro Ester de Carvalho. Na Assembleia Geral do CITEC, de 15 de Maio de 2009, foi aprovado comemorar os 40 anos de actividade do grupo de forma adequada, tendo sido eleita uma comissão coordenadora das mesmas.
De momento esta comissão é construída por quatro pessoas: Carlos Alberto Cunha, Deolindo Pessoa e Henrique Maranha (propostos na Assembleia Geral), e Vasco Neves (Presidente da Direcção do CITEC).
A comissão tem reunido regularmente desde 2 de Junho de 2009 e torna agora público o plano das mesmas para que todos os interessados possam dar o seu contributo.
TEC - fachada actual

O inicio oficial das comemorações dos 40 anos do CITEC será em 25 de Julho de 2010 e prolongar-se-ão até 25 de Julho de 2011.

1. Dia 24 de Julho de 2010
Jantar comemorativo dos 40 anos, aberto a todos os que tenham colaborado na actividade do CITEC ao longo da sua existência, mas também a todas as pessoas que estejam interessadas.
O jantar deverá ter muita animação (música, rábulas, café teatro, etc.), espaço para se conviver e reavivar velhas amizades e histórias. Pretende-se a maior participação possível e seja o reaproximar de todos os que por razões várias têm andado afastados das actividades do CITEC.

2. CITEC – que futuro?
Jornada de reflexão sobre a actividade do grupo, viradas para o futuro e não para o passado, embora sem o esbater ou esquecer (ou o novo não nasça do velho e seja novo por isso mesmo).Realizar um simpósio durante um fim-de-semana (sábado), com diferentes painéis (nº a definir), durante a manhã e a tarde, com diferentes convidados que possam dar uma ajuda nesta reflexão.

TEC antes das obras de recuperação

3. Edição de livro
A edição do livro sobre os 40 anos de actividade do CITEC levanta três questões essenciais a garantir: a criação dos conteúdos, a produção gráfica e a angariação dos apoios necessário.
À falta de melhor título poderá ser CITEC – 1970-2010, 40 anos de luta e amor ao teatro e deverá ser apresentado até ao final do ano de 2010.
Na sua estrutura, sujeita a rectificação futura, foram definidos os seguintes pontos:
......a) Resenha histórica (da actividade desenvolvida ao longo dos 40 anos)
......b) Teatro Ester de Carvalho (factos sobre a titularidade e a recuperação)
......c) Criação (espectáculos produzidos durante os 40 anos)
......d) Festival (diferentes fases e objectivos desde o inicio até hoje)
......e) Contributos (externos e internos, de pessoas que passaram pelo grupo)
......f) Anexos (documentos relevantes)
Para além do livro será também feita uma edição em suporte digital com documentos e imagens que complementem e enriqueçam o arquivo histórico do grupo.
Deolindo Pessoa ficou como responsável da coordenação de conteúdos, mas com a necessária colaboração de todos.

TEC actualmente

4. Projectos alternativos
Actividade fora do CITEMOR, de forma a ocupar periodicamente o TEC e a promover a produção regular do CITEC, além de procurar também explorar outros espaços não convencionais existentes em Montemor-o-Velho.

a. Teatro Esther de Carvalho (TEC)
Para o TEC poderá ser produzida uma trilogia de espectáculos comemorativos dos 80 anos de Harold Pinter (10-10-1930 * 24-12-2008).
Propõem-se peças com duas ou três personagens, o que permitirá a produção de três espectáculos. Assim, dispõe-se de “Uma Ligeira Dor” (Slight Ache), com 2 (1f+1m) ou 3 (1f+2m) actores, “Os Anões” (The Dwarfs), com 3 actores (m), “A Cave” (The Basement), com 3 actores (1f+2m), “O Encarregado” (The Caretaker), com 3 actores (m), “O Amante” (The Lover), com 3 actores (1f+2m), “Paisagem” (Landscape), com 2 actores (1f+1m), “Traições” (Betrayal), com 3 actores (1f+2m), e “Cinza às Cinzas” (Ashes to Ashes), com 2 actores (1f+1m).
Também se colocou a hipótese da reposição de um dos primeiros espectáculos do CITEC, tendo sido debatidas hipóteses: “A Curva”, de Tankred Dorst, e “Na Barca com Mestre Gil”, de Jaime Gralheiro a partir de autos de Gil Vicente. Em primeiro lugar tentar-se-á a última, por englobar mais elementos e ter uma estrutura que facilita os ensaios, além de ter ganho um prémio a nível nacional num Festival Nacional de Teatro de Amadores, cuja final foi em Almada. Esta reposição será só para as comemorações dos 40 anos e não para ficar em reportório.

b. Espaços não convencionais
Com o objectivo de explorar diferentes espaços não convencionais existentes em Montemor, com potencialidades teatrais e dignos de serem utilizados, foram consideradas as seguintes hipóteses:
......i. Praça da República – aproveitando os cafés e esplanadas existentes, e com a sua cumplicidade, poderá ser criado um ambiente de café teatro com múltiplos locais de representação de diferentes histórias e situações. Espectáculo criado a partir de textos curtos (Javier Tomeo, Jonathan Swift, Karl Valentin, Mrozeck, etc.).
.....ii. Biblioteca Municipal – espectáculo a partir de contos de Mrozeck, em que os espectadores percorrerem diferentes espaços da biblioteca, como num museu ou galeria de arte. O quadro será repetido como numa sessão de cinema «non stop» durante a duração do espectáculo.
....iii. Claustro do Convento dos Anjos – local adequado para a apresentação duma adaptação livre de “A Missão” de Ferreira de Castro.
Há outros espaços que poderão ser utilizados: Jardim da Feira, Galeria, etc.

5. Núcleo de Amigos
Lançar um Núcleo de Amigos do CITEC tem como grande objectivo agregar todos os que consideram importante a existência do grupo com capacidade para desenvolver a sua acção de forma contínua e consistente.
Boa altura para promover o seu lançamento e criar um regulamento interno com os direitos e os deveres de cada um.

6. Prémio Esther de Carvalho
Criar um prémio de teatro que vise promover o aparecimento de novos textos sobre o teatro nos seus múltiplos aspectos. Terá um prémio pecuniário, será editada em condições a designar. Se a obra premiada for uma peça o CITEC terá os direitos de montagem.
Há que criar o regulamento, constituir o júri e encontrar os parceiros necessários, só depois se deverá avançar para esta iniciativa.

Nota final:
Para a realização destas comemorações a comissão organizadora necessita do apoio e participação activa de todas as pessoas que passaram pelo CITEC ou que entendam como importante a sua continuação.

Esther de Carvalho

Núcleo de Amigos

Lançar um Núcleo de Amigos do CITEC visa apenas aproximar os que por razões várias se afastaram do CITEC e de Montemor-o-Velho, nada mais do que isso.
Na sequência de algumas reacções já recebidas resta apenas acrescentar que nada impede que o mesmo se converta no Núcleo de Amigos do Teatro Esther de Carvalho.
Tudo está em aberto, pode e deve ser discutido. Há é que aproveitar a oportunidade e vivificar a aproximação ao Teatro, ao CITEC e a Montemor-o-Velho.